Então
é assim. O que os olhos não veem, o coração não sente. E se vejo muito,
acostumo-me. Saída necessária para sobreviver à barbárie humana que legitimamos
a cada dia com o discurso do mérito.
Três
crianças. Idades, imagino eu, entre 7 a 14 anos. Penso na história de vida
delas. Nasceram na rua? Abandono? Fuga de uma realidade mais cruel que a rua e
o olhar de desprezo dos seres humanos que se sentem superiores à fragilidade
humana?
Qual
o futuro que lhes espera diante de uma vida no qual o seu esforço deve ser o de
garantir algo para comer e sobreviver a cada dia?
Que
sentido pode lhes fazer a escola? Local que deveria criticar esse sistema
nojento de exclusão que o capitalismo instaurou, mas que, na maioria das vezes,
apenas o serve de maneira muito eficiente legitimando o discurso do esforço e
da meritocracia. “Se ele tem dificuldade,
que se esforce mais”.
Tornamo-nos
seres humanos cruéis, impassíveis ao outro, às diferenças e dificuldades. Legitimamos
todo dia o ilegitimável com o discurso do mérito. Porque NÃO, não tem pra todo
mundo. Esta é a ordem básica do sistema. Sempre haverá os que não têm, numa
busca constante de um querer imposto, para manter uma minoria poderosa que se
tranca em condomínios e carros blindados a fim de não enxergar a barbárie que
construiu, constrói e construirá com sua lógica, tão racional e pouco humana,
meritocrática.
Sempre
pensei a educação como forma de resistência a tudo isso, mas falar sozinha no
meio da multidão é muito difícil. Consigo apenas ouvir dos mais velhos, tão
mais sábios, que vou crescer e a maturidade me trará a tranquilidade necessária
para deliciar meu almoço sem me incomodar com a pobreza humana bem diante dos
meus olhos. Tomara que não.