Para que serve a utopia?

"A Utopia está no horizonte. Eu sei muito bem que nunca a alcançarei. Se eu caminho dez passos, ela se distanciará dez passos. Quanto mais a procure, menos a encontrarei. Qual sua utilidade, então? A utopia serve para isso, para caminhar!"
Fernando Birri (diretor de cinema)
http://www.youtube.com/watch?v=Z3A9NybYZj8

sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Longe de casa, há mais de uma semana...

O tempo é mesmo uma coisa maluca. Parece que foi ontem que eu estava em casa, imaginando como seria estar num país africano, sozinha, longe de tudo e de todas as pessoas que tornam meu porto seguro.
Pois cá estou, em terras africanas e ao mesmo tempo, esse louco que nos confunde a alma, parece que foi ontem e também que foi há tempos que aqui cheguei.
A viagem foi longa e dividida em escalas. 9h50 num avião, até mesmo para alguém como eu que adora avião, é excessivamente cansativo, apesar da comida e apesar de ter dois bancos só pra mim!
Em terras portuguesas senti o primeiro frio na barriga, mas uma alegria em ouvir tantas línguas, em ver tantas cores e tanta diversidade! Vou gostar disso, pensei. Como a escala seria tão longa quanto o vôo me aventurei pela terrinha em metrô e algumas caminhadas que foram do nada para lugar nenhum... O cansaço falou mais alto e me rendi num café "O melhor da brasileira" onde fui atendida por um garçom cabo-verdiano!
Deixei Portugal para depois. Aeroporto. Espera e mais um vôo que começou parecendo que seria o pior da minha vida, até descobrir bancos vagos ao fim do avião. Três bancos só pra mim. Sono e jantar.
Cabo Verde. Mal desci do avião e já senti o calor. Vou gostar disso também. Fila para mais um carimbo no passaporte. Cá estou em terras cabo-verdianas.
O Reitor da universidade foi me buscar no aeroporto, não poque eu seja assim tão importante, apenas porque um professor de Portugal chegava no mesmo vôo.
E desse momento pra cá já se foi mais de uma semana... E já pude conhecer muita gente bacana! Meus vizinhos são guineenses sempre prontos a ajudar que me fazem companhia para compras no supermercado, praia e me levam para saídas sem rumo em que pude conhecer uma Cabo Verde real, para além de um turismo plastificado.
As pessoas são lindas, estilosas e parecem sempre animadas!
Conheci a praia e o Oceano Atlântico por aqui tem águas lindas, limpas e com peixinhos que nadam com a gente! Mas aqui não tem essa coisa de cadeira de praia, guarda-sol, petiscos e cooler com cervejinha para a praia. Apenas canga e protetor. Também não há quase vendedores ou quiosques... Talvez seja um bom lugar para vender côco (e cerveja!) na praia...
Já experimentei a feijoada cabo-verdiana que é feita com feijão manteiga, legumes e carnes. Goood!
Como nem tudo são flores, logo no início acabei entrando numa conversa que me levou a aprender sobre a antropologia culturalista e compreender que minha perspectiva teórica como educadora e pesquisadora passa longe disso. Também é perceptível por aqui um machismo exacerbado que naturaliza opressões seculares à mulher, entretanto, encontrei também um acolhimento que já me faz sentir em casa!
Já tenho dois cachorros: o Revlon e a Castanha. Revlon virou meu guarda-costas e me segue por onde vou. Castanha quase sempre nos segue também! Tem ainda a Preta que perdeu uma perna traseira ao ser atropelada, mas é a mais rápida entre todos! Tem o Rucas, a Ana Maria... Muitos cachorros!
A universidade, porque afinal eu vim aqui em função de um doutorado, é pequena, mas muito acolhedora! Ontem dei minha primeira aula para a turma de Enfermagem: Direitos Humanos e Bioética e colaborei um pouco na aula de Interculturalidade na turma de Tradução. E como eu gosto da sala de aula!!! Espaço incrível esse!!! Já começo a perceber diversas possibilidades para explorar por aqui
...
foi só uma semana e eu ainda tenho exatos dois meses por aqui e muito a conhecer, muito a trocar nessa perspectiva intercultural que tanto acredito e almejo!








sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Em tempos obscuros, professores são as luzes que tentam apagar



Sonhei em fazer o curso de Pedagogia. Não me tornei professora ao acaso. Foi escolha. Foi crença na educação como liberdade para o pensar. Assim como o mito da caverna de Platão, vejo na educação a possibilidade de sair do obscurantismo que limita.

Não é fácil sair da caverna, deixar o acolhimento do conhecido e seguro para desbravar novas possibilidades de compreensão de mundo, mas professoras e professores empenham para si diariamente a tarefa de tornar essa descoberta mais fácil, mais acolhedora.

Sei que nem todos os profissionais da educação têm a doçura da “Professora Helena” retratada em novelas infantis. Que bom! Aprendemos também com a professora durona ou o professor linha dura. Todos foram importantes para que formássemos crenças e opiniões sobre a vida.

Sei ainda que há professores desestimulados, desorientados e sem ânimo para seguir na carreira. Pudera! Somos os profissionais com nível superior mais mal pagos na carreira. Enfrentamos condições de trabalho precárias nas escolas – públicas e também nas privadas que nos sugam o conhecimento profissional em atividades burocráticas e com festinhas sem sentido pedagógico, que visam apenas marketing e lucro.

No próximo sábado, 15 de outubro, é comemorado o “Dia do Professor”, mas temos pouco – para não dizer nada – a celebrar. Não bastasse a situação precária enfrentada diariamente, enfrentamos agora uma campanha por uma “Escola sem partido” proveniente de advogados e políticos que nada entendem sobre a Educação e têm a audácia de deslegitimar o legado deixado por Paulo Freire, enquanto escutam Alexandre Frota em reuniões no MEC, este que é estuprador confesso de uma mãe de santo.

Conhecida também com a “Lei da mordaça”, o Projeto de Lei “Escola sem partido” busca nos impor, não a ausência de partidos na escola – o que já é uma prerrogativa educacional – mas uma neutralidade que não existe. Ignora desta forma que é na diversidade de ideias e crenças – ideologias – que se dá a possibilidade de livre escolha pelos estudantes e não na limitação das mesmas.

Não bastasse isso, seguimos em tempos temerários em que se muda por Medida Provisória a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional colocando, dentre outros absurdos, que não é mais preciso a formação pedagógica prevista nos cursos de licenciatura para a prática docente. Basta agora “notório saber”.

Em outras palavras, seria como um veterinário operar um ser humano pelo seu “notório saber” em cirurgias. Penso que ninguém admitiria tal fato, a não ser em situações extremas. Ora, por que então na Educação, em que todos clamam por qualidade, tal medida é tomada com ares de benéfices? Por que aceitamos que a educação possa acolher profissionais que não buscaram formação para serem docentes? Que mãe ou pai levaria sua criança doente para ser atendida por uma pedagoga? Por que o contrário não é automaticamente questionado?

Valorização docente? Qual profissional sente-se valorizado sabendo ser sua formação algo considerado dispensável?

Neste cenário, só posso desejar às professoras e professores que sigam firme nos propósitos assumidos para não deixar que o obscurantismo cegue a todos. Apesar de a luz ainda ser repelida pelos que não conseguem ultrapassar o sofrimento dos primeiros instantes de clareza, enquanto houver gente disposta a sair da caverna, a docência estará repleta de sentido.

Parabéns às professoras e aos professores que são luzes! Parabéns a todas e todos que enfrentam mais que a sala de aula desfalcada de recursos e repleta de estudantes, enfrentam a luta pela manutenção do direito à Educação em seu sentido mais amplo. Sabemos que dia 15 de outubro é também dia de luta e lutamos com garra. Aprendemos com o Mestre que “ser professor e não lutar é uma contradição pedagógica” (Paulo Freire).



Publicado no Jornal Novo Contexto em 14/10/2016

terça-feira, 11 de outubro de 2016




A música oração da Banda mais bonita da cidade me traz um sentimento bom. Não sei bem o que é, mas a primeira vez que a ouvi passava por um momento bem triste de perda, dessas perdas do que nunca se teve de verdade, mas ainda assim doía, porque eu sabia que mesmo sem nunca ter tido, dessa vez a perda era pra sempre. Mesmo. E a música chegou e trouxe um sentimento de esperança, um sentimento de que mais cedo ou mais tarde tudo ficaria bem. Nunca ficou bem do jeito que eu realmente sonhava, e sonho, mas talvez esse seja o impulso que preciso pra seguir. A tal da utopia que serve exatamente para fazer caminhar.

O ritmo, a letra, o clip tudo me encanta nessa música repetitiva que não acho cansativa, até porque adoro repetição de coisas que fazem bem. Não gosto de brigadeiro em unidade. Quem come um único brigadeiro? Eu quero logo a panela toda em colheradas generosas. Gosto de intensidade.

E se coração não é tão simples quanto pensa, o meu está apertadinho, mas ao contrário do que possa parecer, ele está comprimido não pela pressão desse mundo externo que nos entorpece com um cenário de desgraças que vai do político ao geográfico, está apertado com tudo que tem dentro e que neste momento, em estado de um permitido, mas não sem a crítica necessária, egoísmo, se sobrepõe ao mundo externo: alegrias, tristezas, saudades, medos, lembranças e ansiedade. Essa última o faz palpitar mais acelerado de tempos em tempos – minutos em minutos para ser mais exata.

Riscar a folhinha em contagem regressiva parece infantil demais, mas faço isso mentalmente a todo momento. Começou no "daqui a um mês..." e agora já está no "daqui a uma semana...". Começo a entender a relatividade do tempo que passou tão rápido e demora tanto a passar! Mas daqui uma semana...

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Ansiedalgia



Como de costume quando em Itu, no fim da tarde, caminhei com a Dalila. As ruas já não são as mesmas da minha infância. Agora existem avenidas onde antes era só mato e uma pontezinha de madeira que dava tom de aventura aos passeios infantis. Dalila me olha assustada pelo som dos carros, motos e caminhões que passam sempre apressados e barulhentos.

Eu, distraída. Penso. Essa mente inquieta que não descansa nem por um segundo. Tenho pensado muito no tempo, resultado da minha ansiedade já diagnosticada neste mundo de vidas e histórias patologizadas. Penso no ontem e no amanhã, não em seu sentido literal, mas no sentido metafórico que permite viagens distantes para o passado e o futuro. Doze dias para eu cruzar uma linha entre o seguro, meu porto conhecido e o novo, total desconhecido, virgem para que eu descubra cada cantinho com o medo e ansiedade de uma primeira vez.

Isso me causa ansiedalgia – um nome que eu inventei para tentar nomear um pouco dos sentimentos que me consomem de maneira desmedida, detesto mesmo coisas mornas. Ansiedalgia é a mistura dessa ansiedade que me consome por querer descobrir o futuro com a nostalgia por tudo de bom que vivi e a dúvida sobre querer voltar e reviver tudo, ou encarar o desconhecido... Na falta de opção, sigo em frente.


Sento num banco de praça com Dalila, ela sobe no meu colo. Vou sentir saudades. Muitas. Penso em tanta gente, no abraço do até logo que vai demorar mais que o comum e também nas pessoas das quais não vou me despedir. Penso em algumas pessoas que talvez não façam ideia que viajarão comigo, na minha mente inquieta. Penso na África e na Europa, antagônicas e complementares. Penso.

Começa a escurecer. O céu está lindo com todas aquelas cores de fim de tarde com sol e vento gelado, incomum para o mês de outubro. Mais um momento na caixinha da nostalgia, e como não dá pra parar no tempo, nem voltar pra trás, sigo em frente...


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