Para que serve a utopia?

"A Utopia está no horizonte. Eu sei muito bem que nunca a alcançarei. Se eu caminho dez passos, ela se distanciará dez passos. Quanto mais a procure, menos a encontrarei. Qual sua utilidade, então? A utopia serve para isso, para caminhar!"
Fernando Birri (diretor de cinema)
http://www.youtube.com/watch?v=Z3A9NybYZj8

terça-feira, 14 de junho de 2016

Fusão de ministérios coloca políticas para diversidade e inclusão em risco


Extinção do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos pode prejudicar o diálogo do governo com movimentos sociais, a continuidade de políticas de ações afirmativas e a defesa dos direitos indígenas


Por Mirian Gonçalves


O Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos, criado na reforma administrativa realizada pela presidenta afastada Dilma Roussef em outubro de 2015 tinha como objetivo fortalecer e aprimorar as políticas de gênero, de combate ao racismo e à proteção dos direitos humanos no país. À época da criação, foi indicada para comandar a pasta a pedagoga e acadêmica Nilma Lino Gomes, primeira mulher negra do Brasil a comandar uma instituição federal de ensino superior, a Universidade da Integração Internacional da Losofonia Afro-Brasileira. Para a então ministra, aquela pasta representava um grande desafio na promoção de políticas públicas para o país.

Entretanto, ao assumir como presidente interino, Michel Temer extinguiu este Ministério, incorporando-o ao de Justiça e da Cidadania, com a nomeação de Alexandre Moraes, secretário de Segurança Pública de São Paulo, como ministro da nova organização da pasta.

A ex-ministra da extinta pasta, Gomes, em entrevista aos Jornalistas Livres, destaca que na reforma
do presidente interino, o único ministério, de fato, extinto foi o das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos. Para ela o motivo é o fato desse ministério ter sido o que mais possibilitou a presença dos movimentos sociais na relação com o governo.

João Ferez Júnior, professor de ciência política da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) e coordenador do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (Gemaa) afirma que a extinção da Secretaria de Promoção de Políticas de Inclusão Racial (Seppir) por Dilma para a criação de um único ministério para tratar das diversas questões de minorias sociais já representou um retrocesso. Antes da fusão, secretários da juventude, das mulheres e da inclusão racial, que tinham status de ministros, eram convidados a participar nas reuniões ministeriais com a presidenta em condições de igualdade com os titulares dos ministérios, e após a fusão, todas aquelas pautas passaram a ter apenas um representante. Entretanto, Ferez Júnior reforça que a extinção do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos é um retrocesso ainda maior com consequências negativas no tocante à continuidade das políticas de ação afirmativa, porque dificulta a interlocução com os movimentos sociais que tencionam as políticas para atender a minorias historicamente discriminadas no país.

De acordo com ele, com um governo mais à direita que o anterior, com partidos que se colocam ideologicamente contrários a vários programas, inclusive ação afirmativa e igualdade racial, pode haver "algum tipo de operação tartaruga, para de alguma maneira dificultar que as políticas ou progridam ou mesmo continuem a funcionar”.

Para Gomes, a pauta das mulheres, dos negros, dos quilombolas, dos direitos humanos, da juventude, são pautas históricas no Brasil, de sujeitos sociais que têm em comum a situação de desigualdade, discriminação e exclusão. A existência desse ministério e dessas áreas em que ele foi dividido e das pautas que estão dentro dele, são respostas que o próprio governo deu para as lutas sociais e para a sociedade da importância dessas questões, da importância desses sujeitos, acompanhando tendências internacionais.

“A característica fundamental dessas pastas é que na verdade você cria oportunidade para pessoas mais próximas dos movimentos sociais ficarem próximas dos governos e, dessa maneira, tentar intervir nas várias políticas que os vários ministérios têm, ou seja, inserir a preocupação da igualdade racial em outras políticas públicas, o que não é muito natural em vários setores das políticas públicas. Então eu acho que é isso, o valor é esse, quando você cancela esse ministério, você de fato acaba com esse tipo de vigília que eles (os movimentos sociais) fazem”, avalia Feres Júnior.

Extinguir esse ministério e colocá-lo sob uma pasta que é o Ministério da Justiça e Cidadania permite a leitura de que movimento social é uma questão de segurança pública, contrariando a ideia de garantia de direitos. Quando se pensa nessa nova perspectiva, os movimentos sociais devem estar sob vigilância, a questão de raça, de gênero, juventude e direitos humanos tornam-se questões de segurança pública e que podem ser aglutinadas em uma coisa só, com uma cidadania genérica, ao desconsiderar o direito dos movimentos sociais com a nomeação de um ministro que tem em seu histórico uma relação muito dura e de criminalização desses movimentos sociais, diz Gomes.

No tocante à questão indígena, a relatora especial das Nações Unidas Victoria Tauli-Corpuz também criticou extinção do Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e direitos Humanos no último Fórum Indígena das Nações Unidas, ocorrido em maio (ver matéria sobre isso no portal amazonia.org). A relatora criticou a falta de avanço do Brasil em relação à defesa dos direitos indígenas e se coloca preocupada com a crise política que pode fazer com que os ganhos recentes possam ser revertidos, e as violações já observadas possam ser exacerbadas. Coloca ainda, que a extinção do ministério promovida pelo presidente interino são “desenvolvimentos (negativos) muito sérios no que se refere ao respeito à proteção dos direitos humanos dos povos indígenas” .

Entenda as mudanças: da Seppir ao Ministério da Justiça e Cidadania
A Secretaria de Promoção de Políticas de Inclusão Racial (Seppir) foi criada em 21 de março de 2003 com o objetivo de incorporar a perspectiva da Igualdade Racial nas políticas públicas para a superação do racismo e consolidação de uma sociedade democrática de fato.

Lei de cotas para negros nas universidades, lei de cotas para negros nos concursos públicos, políticas de promoção de igualdade racial, como o Brasil Quilombola e o plano Juventude Viva foram algumas das realizações da Seppir ao longo desses treze anos de trabalho conjunto com os outros ministérios e com os movimentos sociais.

Em 2010 a Seppir passou a ser uma secretaria com status de Ministério, com o objetivo de construir políticas de promoção da igualdade racial por meio de políticas de ação afirmativa e com o grande desafio de realizar uma política transversal.

Com a reforma realizada por Dilma em 2015, a secretaria que antes possuía apenas o status de ministério tornou-se o Ministério das Mulheres, da Igualdade racial e dos Direitos Humanos. O novo ministério se estabeleceu com uma Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres, comandada por Eleonora Menicucci; uma Secretaria Nacional de Igualdade Racial, dirigida por Ronaldo Barros; e uma Secretaria Nacional de Direitos Humanos, liderada por Rogério Sottili. Para dirigir o ministério, foi escolhida a ministra da Seppir, Nilma Lino Gomes.

Com aquela reforma, pela primeira vez na história do movimento negro e das políticas públicas no Brasil, houve um ministério que tinha como característica a igualdade racial. Como ministério, há autonomia para pensar políticas, sem a dependência administrativa ao Ministério da Justiça, ou à Presidência da República, como na formação anterior de Secretaria. O Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos compunha um Ministério como todos os outros no estado brasileiro e esta foi uma perspectiva muito importante.

Com a composição das três pastas transversais – Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos –, o Ministério tinha o desafio de promover uma transversalidade interna e externa, exigindo grande capacidade de articulação com os demais ministérios e com os movimentos sociais de três grandes grupos que se subdividem ainda em suas demandas: mulheres que se desdobram em diversos movimentos feministas e movimentos de mulheres negras, diversos movimentos dos direitos humanos e o movimento negro em toda a sua complexidade, além da juventude que também foi incorporada pelo ministério como um quarto grupo.

Com a nova reforma realizada pelo presidente interino, todas essas pautas, de lutas históricas, devem ser incluídas no Ministério da Justiça e Cidadania e ainda é difícil prever se e como seguirão as políticas em andamento e que tiveram significativo avanço nos últimos 13 anos.

No site oficial do novo Ministério, ainda não há referência às políticas de Inclusão Racial, enfrentamento ao racismo, ao machismo, políticas para juventude ou direitos humanos, por exemplo.



Publicada originalmente na Revista de Jornalismo Científico Com Ciência em 13/06/2016

sexta-feira, 3 de junho de 2016

Cotas Étnico-raciais na UNICAMP

Após conseguir a aprovação de cotas étnico-raciais na pós-graduação do IFCH, Frente Pró-Cotas da Unicamp amplia a atuação para conseguir o mesmo feito em outras unidades.

Por Mirian Lúcia Gonçalves – Dezembro/2015


A Universidade Estadual de Campinas – a Unicamp, não adota o sistema de cotas e deixa a cargo do Programa de Ação Afirmativa e Inclusão Social (PAAIS), implantado em 2004, o objetivo de incluir e aumentar a representatividade de estudantes da rede pública e também da diversidade étnica e racial na comunidade acadêmica. O programa oferece um acréscimo de pontos no vestibular às pessoas desses grupos, no entanto, diferente do que acontece nas universidades federais que por lei devem ter em seu quadro discente a representação da população negra e indígena da unidade federativa na universidade, na Unicamp os dados dos ingressantes não alcançam essa representatividade. Enquanto a soma da população negra e indígena brasileira é de 53,4% e no estado de São Paulo é de 34,7%, no último vestibular da Unicamp (2015) o ingresso de pessoas pretas, pardas e indígenas ficou em 15,7% (2,3%, 13,2% e 0,2% respectivamente) em relação ao total de matrículas. Esse número ainda varia conforme o curso, sendo notável a diminuição desta porcentagem em cursos de maior concorrência como medicina, por exemplo, em que os matriculados autodeclarados pretos e pardos somam 9,1% (1,8% e 7,3% respectivamente) sem nenhum indígena matriculado.

Para enfrentar esse ciclo de exclusão racial contido nos processos seletivos das universidades públicas a Frente Pró-Cotas pressiona a Unicamp a adotar cotas étnico-raciais na pós-graduação. O grupo conseguiu a sua primeira vitória quando em 11 de março de 2015 foi aprovada em reunião da congregação a implantação de cotas étnico-raciais na pós-graduação do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp.



A Frente Pró-Cotas

A Frente Pró-Cotas da Unicamp é uma entidade formada por estudantes de graduação e pós-graduação de diversos cursos da universidade que trazem à tona a discussão sobre a necessidade de cotas étnico-raciais. As reuniões da Frente acontecem semanalmente e, atualmente, são realizadas no Instituto de Economia, abertas a todos interessados na discussão sobre ações afirmativas.

O grupo conta também com a participação de professores e funcionários que atuam como apoiadores, algumas vezes com grande importância, como relata um membro da Frente que prefere não se identificar uma vez que o grupo é formado sem hierarquias institucionalizadas e tem por preceito se apresentar apenas enquanto coletivo. Para ele “Os professores que se dispuseram a nos auxiliar deram apoio no âmbito institucional do IFCH, abrindo espaços, por exemplo, para nossa participação nas reuniões de departamentos e na congregação. Alguns professores também participaram de rodas de conversas e debates que organizamos ao longo do ano passado (2014). Já os funcionários, nos ajudaram nos momentos em que a mobilização precisava se intensificar. O STU deu apoio com estrutura de som e impressões de textos e cartazes que produzimos.”

Outros motivos que levam os participantes a preservar a identidade individual é a possibilidade de perseguição política dentro dos seus institutos, o que já foi vivenciado em forma de assédio por membros do corpo docente, e também para evitar um protagonismo individual.

A luta até chegar à aprovação das cotas étnico-raciais na pós-graduação do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas – IFCH começou no final de 2013. Inspirados no exemplo do Museu Nacional do Rio de Janeiro, que determinou a implementação de cotas étnico-raciais no programa de Antropologia Social no segundo semestre de 2013, um grupo de estudantes encontrou uma brecha institucional para discutir as cotas na Unicamp: a autonomia dos programas de pós em decidir a forma e os critérios dos processos seletivos sem passar pelo Conselho Universitário.

Assim, após diversas reuniões e atividades no IFCH que colocavam a temática em discussão, o grupo teve como primeiro resultado um documento escrito com a Proposta de Cotas Étnico-Raciais e de Pessoas com Deficiências para Programas de Pós-graduação.

O documento foi apresentado à congregação e com a mobilização de muitos estudantes de graduação e de pós-graduação, foi realizado o debate e o princípio das cotas foi aprovado no IFCH. O trabalho prosseguiu com participação nas reuniões dos departamentos e de acordo a Frente atualmente apenas o curso de demografia apresenta resistência para a aprovação das cotas, embora existam professores deste curso que apoiam a ideia. Os cursos de Filosofia, Demografia e Ambiente & Sociedade lançarão os processos seletivos com cotas em 2016. Os cursos de Antropologia Social, Ciências Sociais, Ciência Política, História, Relações Internacionais e Sociologia já apresentaram edital com cotas étnico-raciais neste ano. Nenhum curso adotou cotas para pessoas com deficiência como constava na proposta elaborada pela Frente.

O objetivo desta proposta, segundo a Frente, não é, contudo, questionar a meritocracia em si uma vez que as cotas também constituem sistemas meritocráticos de seleção, dado que a disputa pelas vagas entre os optantes é inevitável. Porém, as cotas intentam criar condições de competitividade entre pessoas e grupos com equivalentes trajetórias sociais, ou seja, o que os sistemas de cotas fazem é questionar os modelos atuais de aplicação da meritocracia nos processos seletivos, os quais se sustentam em uma pretensa igualdade de direito, mas não de fato.

Com a aprovação no IFCH, a expectativa do grupo é que isso tenha um efeito multiplicador, primeiro em programas de pós de outros institutos e faculdades, e depois para a graduação. Com essa perspectiva, a atuação da Frente segue agora para a Faculdade de Educação de Educação (FE), e vem organizando ciclos de debate junto ao Núcleo da Consciência Negra e da Associação de Pós-Graduandos da Faculdade para discutir a possibilidade de cotas étnico-raciais para o seu programa de pós-graduação. Para a Professora Ângela Soligo (departamento de psicologia educacional, Grupo Diferença e subjetividade da FE,) a faculdade está atrasada neste debate: “Em nosso Programa, formamos muitos professoras e professores, que estão nas salas de aula em todos os níveis, e são em sua maioria brancas e brancos. É hora de trazermos para a pós-graduação as professoras e professores, pesquisadoras e pesquisadores negras e negros, com suas histórias, suas lutas, sua singularidade. E contribuirmos para que se fortaleçam academicamente. Somos uma universidade pública, e a pós-graduação é um dos nossos nichos mais excludentes. Em uma faculdade que fala em inclusão, em democratização do ensino, isso é uma contradição insuportável.” completa a docente.


Por que cotas étnico-raciais?

No Brasil o legado nefasto da colonização e da escravidão fez com que o racismo se tornasse uma marca estrutural na sociedade brasileira, operando institucionalmente e também nas relações pessoais cotidianas. Assim, as cotas são uma forma de reparação e compensação que busca corrigir a situação de discriminação e desigualdade infringida principalmente aos negros no passado e que se mantém até os dias atuais.

Em países como a Índia, Malásia, Austrália, África do Sul e Estados Unidos programas de ação afirmativa datam de meados do século XX, no entanto, no Brasil a dificuldade da discussão da temática se sobrepõe porque aqui se manteve forte a equivocada ideia de uma democracia racial que prega a ideologia de que não existe racismo no Brasil e faz perpetuar as injustiças uma vez que se difunde a crença de que somos todos iguais e que se os negros não atingem os mesmo patamares que os não negros, é por falta de competência ou de interesse destes.

Entretanto, o povo negro desde o fim da abolição da escravidão se organizou em movimentos para lutar contra a opressão a que estavam submetidos, levantando a discussão sobre a necessidade de políticas para reparar as desigualdades sociais impostas ao povo negro em função de um racismo institucional.

Apenas em 2001 o Brasil rompeu com o silêncio institucional sobre a questão racial ao participar da II Conferência Mundial de combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, em Durban na África do Sul. O primeiro resultado prático surge no Estado do Rio de Janeiro que assume um pioneirismo ao implementar, em 2003, legalmente um sistema de cotas étnico-raciais para universidades públicas estaduais. Em 2004 a Universidade de Brasília (UnB) e a Universidade Federal da Bahia (UFBA) também aprovaram programas de cotas étnico-raciais nos cursos de graduação.

No plano nacional, em 2012, o Supremo Tribunal Federal aprovou a constitucionalidade das cotas étnico-raciais com a promulgação da Lei Federal 12.711/12 que prevê 50% do total das vagas das Universidades e Institutos Federais para estudantes de escolas públicas, dentro desta reserva, 50% das vagas são reservadas a estudantes com renda familiar bruta de até um salário mínimo e meio per capita, e aos pretos, pardos e indígenas fica reservada a porcentagem proporcional ao levantamento da população da unidade da federação onde está instalada a instituição, segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Essas medidas vêm no sentido de, finalmente, reconhecer a dívida histórica que o Brasil tem com a população negra.

Os contrários às cotas trazem, entre outras críticas, a ideia de que as cotas vão fazer da nossa sociedade, uma sociedade racista, no entanto os números mostram que os negros no Brasil em todos os âmbitos estão em situação de desvantagem em relação aos não negros, estando o racismo imbricado nas instituições públicas e privadas e agindo de forma silenciosa. Portanto, as cotas não criam o racismo, ele já existe. As cotas ajudam a colocar em debate sua perversa presença.


Cotas na Pós-Graduação

No âmbito da Pós-Graduação, o Rio de Janeiro também saiu à frente ao implementar cotas nas universidades públicas mantidas pelo governo estadual. A lei 6.914 foi publicada no Diário Oficial no dia 06 de novembro de 2014 e estabelece que 12% das vagas sejam destinadas a negros e indígenas, 12% para egressos carentes de instituições públicas ou privadas e 6% para pessoas com necessidades especiais, filhos de policiais civis, militares, bombeiros militares e inspetores de segurança e administração penitenciária, mortos ou incapacitados em razão do serviço. Ao todo a reserva é de 30% das vagas ofertadas em cada curso.

A criação de cotas na pós-graduação possui o objetivo de trazer para o espaço de pesquisa acadêmica o questionamento das formas de exclusão racial que, por muito tempo, foram pensadas como restritas às etapas anteriores de ensino. Elas podem ainda proporcionar a produção de conhecimentos vinculados a concepções teóricas, questionamentos e referências culturais dos grupos até então não participantes deste espaço.

Além disso, com a inclusão de pesquisadores negros e negras aumenta a possibilidade de se romper com o que Boaventura de Souza Santos chama de epistemicídio. Para ele o genocídio causado pela expansão europeia foi também um epistemicídio porque, além de eliminar os povos diferentes, eliminou também as suas formas de conhecimento. Para Sueli Carneiro o epistemicídio deslegitima o povo negro como portador e produtor do conhecimento, desqualifica e ignora as formas de conhecimento desses povos. Assim, faz-se urgente incluir novos olhares e conhecimento para uma universidade plural que caminhe para além do conhecimento eurocêntrico.

Para a Professora Ângela “o trabalho da Frente é fundamental, porque coloca em debate a necessidade de democratização da universidade, levando em conta as desigualdades raciais, e o faz de forma constante e intensiva. Constrói diálogos com os estudantes, traz referências para reflexão, pauta as coordenações e direção geral da universidade. A frente é uma importante referência na luta contra o racismo e a universidade excludente.”

A Professora conclui ao dizer sobre a dificuldade que acredita que será pautar essa discussão na FE que, embora necessária, não será fácil. Para a docente, a força do discurso meritocrático e uma visão elitista de formação acadêmica, traz uma resistência muito grande em assumir o racismo e aceitar que, pelo silêncio e passividade, somos coniventes com ele.

“Não será uma empreitada fácil, mas temos cada vez mais docentes comprometidos com a democratização da universidade e devemos sim batalhar por esse avanço. No Fórum Penses sobre racismo, ouvi do professor José Jorge, da UNB, formulador da política de cotas daquela universidade, uma frase que me tocou e vou repetir sempre: a universidade que não adota cotas é uma universidade racista. Esse deve ser nosso ponto de partida.”

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