A expressão “grelo duro” utilizada pelo
ex presidente Lula em conversa telefônica com Paulo
Vannucchi, divulgada pelas mídias ainda tem causado debates e
críticas.
A última crítica a que tive acesso foi
feita pela deputada Mara
Gabrilli do PSDB de São Paulo que em nota repudia a fala
considerando-a misógina e desrespeitosa. Engraçado que ela repudia o “grelo
duro”, mas não se incomoda em usar “denegrir” por diversas vezes, expressão
racista rechaçada pelo povo negro por significar tornar preto. E por que tornar
preto é ruim?
Discordo veemente da deputada, mas
entendo o seu papel em ser oposição até mesmo em temas que poderiam lhe ser empoderador.
Sim, empoderador. “Grelo duro” como já
foi explicado por diversas feministas trata-se de um regionalismo nordestino
que quer dizer “mulher porreta”, ou seja, denota uma mulher forte, pronta para
o combate, o que faz ainda mais sentido em terras extremamente machista. Penso
em mulheres naquelas terras de coronéis que precisam mesmo serem mulheres do
grelo duro para enfrentar toda a opressão e violência.
Onde está a misoginia quando Lula chama
por mulheres fortes para serem protagonistas de um processo de enfrentamento,
seja lá o lado em que você se encontra nesta guerra que se tornou o cenário
político brasileiro.
Ora, não teria o mesmo efeito de
indignação se Lula tivesse usado “chama os homens pra colocar o pau na mesa!”
para defender o governo porque o falocentrismo sempre esteve presente em nossa
sociedade com ares de normalidade, a não ser no movimento feminista, sempre descredibilizado
por muitas das pessoas que saem agora em defesa das mulheres contra a “fala
machista do ex presidente”, conforme esbravejam.
Não acho que Lula seja feminista. De
forma alguma. Considero a conversa com Dilma em que ele diz que “ela achou que
fosse um presente de Deus” em relação aos policiais federais na casa de Clara
Ant machista sim. Mas infelizmente um machismo recorrente que entre amigos e
amigas reproduzimos em tom de piada. Cultura essa que precisa ser mesmo mudada,
eliminada.
Entretanto, não vi tantos novos
feministas quando da acusação de agressão à mulher de Aécio, por exemplo. Mas não
quero recorrer ao velho e válido argumento dos dois pesos e duas medidas,
porque a situação exige mesmo uma reflexão sobre nossos preconceitos diários.
Para mim, como mulher que enfrenta o
machismo diariamente, a misoginia está em quem não quer entender as mulheres de
“grelo duro” como o lado forte, em quem não admite que dessa vez não sejam os
homens que estejam sendo chamados a pôr o pau na mesa, mas as mulheres de grelo
duro! O preconceito está ainda em ignorar e ressignificar contra o feminismo um
termo utilizado na região do Brasil que sofre com os achismos de quem advoga em
prol de separatismo e/ou acredita que “lá pra cima” é terra de gente
preguiçosa.
Considero de extrema má fé, ignorância
ou mau caratismo mesmo, gente que sempre acusou as feministas, usarem agora uma
fala dita entre amigos para tentar destruir ainda mais a imagem de um líder
popular como Lula. De repente tornamo-nos todos paladinos da moral, do
feminismo e da idoneidade.
Espero toda essa gritaria contra o fiu fiu diário na rua. Em respeito ao
meu corpo, independente do jeito que eu decida apresentá-lo. Na aceitação do
meu não como verdade a ser respeitada. No respeito pelo meu lugar de fala, de mulher
de grelo duro sim, na luta e no deleite da vida.