Para que serve a utopia?

"A Utopia está no horizonte. Eu sei muito bem que nunca a alcançarei. Se eu caminho dez passos, ela se distanciará dez passos. Quanto mais a procure, menos a encontrarei. Qual sua utilidade, então? A utopia serve para isso, para caminhar!"
Fernando Birri (diretor de cinema)
http://www.youtube.com/watch?v=Z3A9NybYZj8

sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Em tempos obscuros, professores são as luzes que tentam apagar



Sonhei em fazer o curso de Pedagogia. Não me tornei professora ao acaso. Foi escolha. Foi crença na educação como liberdade para o pensar. Assim como o mito da caverna de Platão, vejo na educação a possibilidade de sair do obscurantismo que limita.

Não é fácil sair da caverna, deixar o acolhimento do conhecido e seguro para desbravar novas possibilidades de compreensão de mundo, mas professoras e professores empenham para si diariamente a tarefa de tornar essa descoberta mais fácil, mais acolhedora.

Sei que nem todos os profissionais da educação têm a doçura da “Professora Helena” retratada em novelas infantis. Que bom! Aprendemos também com a professora durona ou o professor linha dura. Todos foram importantes para que formássemos crenças e opiniões sobre a vida.

Sei ainda que há professores desestimulados, desorientados e sem ânimo para seguir na carreira. Pudera! Somos os profissionais com nível superior mais mal pagos na carreira. Enfrentamos condições de trabalho precárias nas escolas – públicas e também nas privadas que nos sugam o conhecimento profissional em atividades burocráticas e com festinhas sem sentido pedagógico, que visam apenas marketing e lucro.

No próximo sábado, 15 de outubro, é comemorado o “Dia do Professor”, mas temos pouco – para não dizer nada – a celebrar. Não bastasse a situação precária enfrentada diariamente, enfrentamos agora uma campanha por uma “Escola sem partido” proveniente de advogados e políticos que nada entendem sobre a Educação e têm a audácia de deslegitimar o legado deixado por Paulo Freire, enquanto escutam Alexandre Frota em reuniões no MEC, este que é estuprador confesso de uma mãe de santo.

Conhecida também com a “Lei da mordaça”, o Projeto de Lei “Escola sem partido” busca nos impor, não a ausência de partidos na escola – o que já é uma prerrogativa educacional – mas uma neutralidade que não existe. Ignora desta forma que é na diversidade de ideias e crenças – ideologias – que se dá a possibilidade de livre escolha pelos estudantes e não na limitação das mesmas.

Não bastasse isso, seguimos em tempos temerários em que se muda por Medida Provisória a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional colocando, dentre outros absurdos, que não é mais preciso a formação pedagógica prevista nos cursos de licenciatura para a prática docente. Basta agora “notório saber”.

Em outras palavras, seria como um veterinário operar um ser humano pelo seu “notório saber” em cirurgias. Penso que ninguém admitiria tal fato, a não ser em situações extremas. Ora, por que então na Educação, em que todos clamam por qualidade, tal medida é tomada com ares de benéfices? Por que aceitamos que a educação possa acolher profissionais que não buscaram formação para serem docentes? Que mãe ou pai levaria sua criança doente para ser atendida por uma pedagoga? Por que o contrário não é automaticamente questionado?

Valorização docente? Qual profissional sente-se valorizado sabendo ser sua formação algo considerado dispensável?

Neste cenário, só posso desejar às professoras e professores que sigam firme nos propósitos assumidos para não deixar que o obscurantismo cegue a todos. Apesar de a luz ainda ser repelida pelos que não conseguem ultrapassar o sofrimento dos primeiros instantes de clareza, enquanto houver gente disposta a sair da caverna, a docência estará repleta de sentido.

Parabéns às professoras e aos professores que são luzes! Parabéns a todas e todos que enfrentam mais que a sala de aula desfalcada de recursos e repleta de estudantes, enfrentam a luta pela manutenção do direito à Educação em seu sentido mais amplo. Sabemos que dia 15 de outubro é também dia de luta e lutamos com garra. Aprendemos com o Mestre que “ser professor e não lutar é uma contradição pedagógica” (Paulo Freire).



Publicado no Jornal Novo Contexto em 14/10/2016

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