Para que serve a utopia?

"A Utopia está no horizonte. Eu sei muito bem que nunca a alcançarei. Se eu caminho dez passos, ela se distanciará dez passos. Quanto mais a procure, menos a encontrarei. Qual sua utilidade, então? A utopia serve para isso, para caminhar!"
Fernando Birri (diretor de cinema)
http://www.youtube.com/watch?v=Z3A9NybYZj8

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

CONVERSAS COM O ESPELHO - PARTE 9


Demitida. DE-MI-TI-DA. Por que eu? Por que comigo?
“A empresa está precisando diminuir os gastos e houve a necessidade de alguns cortes, não é nada pessoal, o seu trabalho é ótimo e temos a certeza de que não será difícil você se recolocar no mercado de trabalho, mas entenda que nesse momento a empresa precisa tomar algumas decisões e bla bla bla...”
Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!”
Deve existir alguma lei da Física que impede que se mantenha uma estabilidade emocional. Depois das bodas, da viagem de “lua de mel”, parecia que finalmente tudo iria ficar bem, e eu já ousava pensar no meu happy end, e agora...
Começo a pensar em como ocupar meu tempo. Parte dele irá para terapia. Eu preciso de alguém que me ouça e que me retorne alguma resposta. Eu preciso de respostas!
O pouco tempo que sobrará eu pretendo dedicar às crianças, mas tenho medo de não saber como fazer isso. Fico pensando que nunca fui mãe em tempo integral. Como é ter um dia inteiro com os filhos? Será que eu dou conta? Será que eu sei ser esse tipo de mãe? E se eles passarem a me odiar?
Acho que vou me matricular em algum curso. Tentar algum curso de madames. Ou me irrito com elas e mato uma, ou convenço-me a ser uma delas e aceito os peitos que Victor me ofereceu de presente.
Ando com uma fixação com silicone... Tenho falado muito nisso, pensado muito nisso. Acho que Victor abalou minha auto-estima com essa oferta. Auto-estima que nesse caso específico já não estava muito “pra cima”.
Tenho 40 anos, e quando pensei que tudo estava exatamente do jeito que eu havia pensado, estou desempregada. Meu Deus, como essa palavra pesa! Victor, tentando me acalmar, me animar talvez, disse para eu não me preocupar, que não teríamos problemas financeiros com isso, que ele estava prestes a conseguir a promoção que tanto batalhara e com o seu aumento continuaríamos a ter a nossa vida confortável de sempre.
E eu? Como eu fico nessa história? E a minha carreira? No fim Victor é apenas mais um machistazinho disfarçado. Deve estar muito feliz de poder dizer que tem a mulher em casa. Estou até vendo ele me oferecendo um cartão de crédito para poder compartilhar com os amigos as piadas sobre os gastos das esposas.
Eu estou parecendo uma panda, e não é porque dormi bêbada de rímel. São olheiras profundas de quem chorou por horas, inconsolável. Tento me consolar lembrando da insuportável da Deise, com que não terei mais que conviver. Uma mulher arrogante, metida a intelectual, mas que diz que está “meia cansada” de trabalhar tanto e pensa em mudar de ramo. Mudar de ramo! Sei, vai assumir a profissão que a colocou onde está hoje. A mulher é iletrada! Uma vez me mandou uma mensagem dizendo “ADEVIR alguém muito especial para te fazer feliz”. O resto da frase também tinha erros, lógico, mas nada que se compare ao “adevir” que deve ser irmão do Ademir do Xerox. [RS]
Muito bem, Cláudia, Parabéns! O seu há de vir é perfeito, e daí? Olha pra você agora! Ahhhhh!!!! Eu não sei como vou sobreviver!!! Vou morrer de saudades do pessoal do administrativo, era lá que eu me mantinha atualizada nas gírias atuais. Passar por lá era sempre certeza de muita risada. A garotada do Xerox, sempre tão atenciosos e simpáticos.
Garotada? Quando é que eu comecei a falar assim, meu Deus?!?! Não faz nem 24 horas que estou em casa e já estou incorporando todo o peso de ser uma quarentona dentro de casa.
A D. Bene do cafezinho, diria para eu parar de ser boba, que ainda sou uma menina. Eu vou morrer de saudades de tudo isso. Talvez sinta saudade até da Deise “meia cansada”, porque ao menos ela nos proporcionava boas gargalhadas, ainda se ela tivesse me enviado um bilhete garantindo que “adevir” um emprego melhor pra mim.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

...

Hoje, 20 de fevereiro de 2011, meu pai faria 59 anos, não fosse o mundo em que vivemos...
Não fosse a injustiça social que renega à pobreza: crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos colocados num lugar à parte na sociedade...
Não fosse a indiferença de políticos que embolsam milhares, milhões de reais em suas falcatruas ao invés de investir em políticas públicas de educação de qualidade, saúde, moradia...
Não fosse a sociedade a marginalizar jovens pobres a um destino sem sonho, sem expectativas...
Não foi apenas um marginal que fez disparar uma arma para se safar de um assalto mal sucedido. Foi tudo isso e mais.
Foi toda madame que olhou com desprezo para um menino de rua.
Foi todo o achismo barato de que na favela só tem bandido!
“...o crime é um protesto contra a anormalidade do sistema social e só...” (Crime e Castigo - Dostoiévski)
As vítimas de algum crime ficam à espera de justiça. Que justiça se pode esperar depois de uma perda?
Eu, assim como Paulo Freire, espero por uma justiça social, que seja rápida e urgente, e se implante antes da caridade.  

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

CONVERSAS COM O ESPELHO - PARTE 8


Depois de uma breve divagação com a dúvida se tudo aquilo era mesmo real, decidi trazer-me de volta àquela situação e percebi Victor amigo da “galerinha” e aceitando algo verde deles. A princípio achei tudo um absurdo. Então era esse o cenário de viagem de bodas? Perdidos em Búzios, num albergue úmido de madeira, com uns hippies, e um cigarrinho de maconha?

Ao menos a chuva já tinha parado e Victor me convenceu a sair do quarto, o que também não precisava de muita insistência. Acabamos caminhando até a praia que era bem perto dali. Victor me olhou como quem diz “que tal?”, já acendendo um fósforo que havia pegado com os hippies também. Acabamos a noite rindo à toa e, deitados na areia molhada, adormecemos. Acordamos a tempo de presenciar um nascer do sol espetacular. Nessa hora, olhei para nós e já estávamos rindo muito, não mais pelo efeito anestesiante do nosso cigarro, mas por pensarmos sobre com qual moral falaríamos sobre drogas e segurança para nossos filhos... Mas essas são histórias apenas para contar para os netos.

Voltamos para o quarto e os hippies, agora melhores amigos de Victor, já estavam todos na “pegada” para curtir umas ondas. Então eles eram surfistas? Jurava que eram hippies! Essa geração não tem muita personalidade, pensei. Acabamos tomando café da manhã juntos e foi muito agradável. Eram jovens animados, felizes, curtindo a vida. Aproveitando a semana do saco cheio da universidade para viajar. Senti até uma certa invejinha deles. Daquela alegria toda, aquela vida saltando pelos olhos, aquela ânsia por viver, por aproveitar cada segundo, quase me senti uma universitária ao lado deles com tantas recordações que tomaram conta de mim.

Depois do café fomos direto para recepção para encerrarmos nossa breve estadia no albergue e o hippie da recepção nos presenteou pelas nossas bodas e não nos cobrou absolutamente nada. Ainda deixou um cartão do “Hostel” para quando quiséssemos voltar. Ele garantiu que sempre teria um quarto especial para nós. Acabamos ficando sem graça de não pagar, afinal, nos alojamos ali por algumas horas e Victor deixou uma cervejinha para o hippie.

Entramos no carro e fui logo dizendo: Por que é que não perguntamos como chegamos no nosso hotel? Victor disse que seria muito descortês da nossa parte pedir informação sobre um hotel depois de termos sido tão bem tratados no “Hostel”. Agora ele nem dizia mais albergue. Sabíamos que nosso Hotel ficava de frente para o mar, então não deveria ser tão difícil encontrá-lo. Seguimos até a praia novamente, andamos uma quadra e lá estava: nosso hotel. Nosso hotel estava apenas há uma quadra do Hostel.

Lá eu mal precisei sair do carro com tantos paparicos de funcionários para tudo. Chego a me sentir sufocada, mas tudo que eu queria era um bom banho e cama. Dessa vez apenas para dormir. E dormimos, novamente até o anoitecer. E lá se foram dois dias da nossa viagem.

Saímos da hibernação apenas para o jantar. Tudo uma delícia, mas uma gente estranha, nariz empinado, que fala baixinho. Não gosto! Comecei a sentir falta dos hippies. E eu estou até agora sem entender o porquê, mas um casal, desses novos burgueses, não sei se eram mesmo, mas eram típicos, resolveram ficar nossos amigos. Não! Não estávamos ali pra fazer amizade com uma mulher que usa maquiagem e jóias para ir à praia e um marido brancão que parece um pão cru que parece ter sido alfabetizado apenas para dizer “sim, meu amor”. Eu sei. Esses não são motivos cabíveis, mas eles eram enfadonhos. Já no nosso primeiro jantar decidiram sentar-se conosco. Dizem que sempre fazem isso, escolhem um casal para partilhar a companhia deles. Deve ser porque eles sozinhos não se agüentam!!!!!!

Eles nos acompanharam também no dia seguinte por todos os lados. Café da manhã, praia, lojinhas. Escolhi um boteco pé na areia, beira mar para parar, imaginei que a madame odiaria e desistiria da nossa companhia, mas não! Ela reclamou, mas disse que gostara tanto da nossa companhia que faria esse sacrifício por nós. Ele, um palerma, do tipo que só dizia: “Sim, senhora” e pagava as contas, aceitou também sem pestanejar. Foi então que encontramos nossos amigos, os hippies surfistas, nesse momento nossos melhores amigos. Foi uma juntação de mesas, cerveja pra todo mundo, camarão, peixe frito, caipirinha. Adoro! Mas não demorou muito para a Rôrô, foi assim que ela se apresentou e esqueci-me de perguntar seu verdadeiro nome, sentir dor de cabeça e dizer que nos aguardaria para o jantar no Hotel. Mal consegui ouvi-la pois nesse momento a música já rolava alto e já estávamos dançando a beira mar e rolando na areia já sob a luz de uma lua espetacular.

Chegamos no Hotel tão felizes que fomos convidados a usar o elevador de serviço. Acordei no outro dia meio empanada de areia ainda. Talvez por isso tenham pedido para usarmos o elevador de serviço.

Os outros dias foram mais normais. Resolvemos nos disfarçar de casal quarentão em busca de descanso e ficamos na vidinha mansa e comportada sem mais cigarrinhos ou grande porres. Na verdade eu já não agüentava mais ficar de ressaca, e então aproveitamos para aproveitar mais a dois. Nosso casal de “amigos” já havia nos abandonado e nem nos disseram tchau. Bandidos. [RS.]

No último dia ainda acordamos cedo e nos ocupamos nas lojinhas comprando as lembrancinhas para as crianças, mãe, pai, sogra, empregada... “Estive em Búzios e me lembrei de você”... Uma mentira. [RS.]

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

FRIDA

Talvez seu caminho fosse mesmo o acadêmico, era que o pensava Frida tentando convencer-se de que tudo estava como deveria estar. Tentava então ir mais devagar e entregar-se por inteiro aos projetos que tinha. Terminar o que começara, da melhor maneira possível, eis sua prioridade!

Como sempre queria mais, e apesar de tentar desacelerar um pouco, desejava também dedicar-se à arte para dar mais leveza à sua vida. Dança, teatro, canto, quem sabe! Era preciso fazer algo mais. Deixar o medo de lado e apenas fazer. Bem ou mal. Não importava mais. Não ligaria mais para essas subjetividades que atravancavam desejos maiores que não podiam mais ser ignorados.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

FRIDA

E Frida estava mais desorientada do que nunca. Novamente não tinha emprego. Não tinha um amor. Sentia não ter nada e envergonhava-se em sentir-se assim diante das mazelas do mundo.

Frida estava decepcionada, mas ao menos dessa vez sentia o alívio de não ser consigo mesma. Não entendia como algumas pessoas eram capazes de articulações tão excêntricas para lucrar. Mas tinha a certeza de não querer compartilhar disso de forma alguma e, apesar de sentir-se tranqüila diante de sua decisão, sentia-se triste e angustiada com sua falta de forma angular para encaixar-se nesse mundo de asfalto e sem coração.

Assustada e ansiosa entendia perfeitamente a necessidade dos alcoólatras para encarar a cruel realidade. Viver sóbrio e consciente, isso sim são coisas de louco.

LIBERDADE É AMAR

Você ama alguém. Esta é a certeza que move suas decisões. Seu jeito de se vestir. Os lugares aos quais decide ir. Alguns de seus prazeres e muitas das suas lágrimas.

Não interessa que você não é correspondido. Você ama e ponto final. E esse sentimento, mesmo não compartilhado, oferece uma certeza na sua vida. Você sabe sobre você e sobre seus desejos.

Até que um dia, assim, sem mais nem menos, você se dá conta que não é amor. É carência, tesão, amizade talvez, uma paixão que passou. Mas não amor. Aí você é capaz de perceber como aquele sentimento que incomodou por meses, anos; que te fazia prisioneiro de pensamentos e ilusões, oferecia um conforto maior que a incerteza que se instaurou sobre você desde o momento da descoberta do não amor.

Aquele sentimento, que agora você não sabe mais denominar, te deixava no comodismo de não ter mais que procurar pela pessoa ideal, tamanha era a certeza de já tê-la encontrado. O sentimento novo, do não amor, desorienta. Angustia. Deixa um vazio que te faz desesperadamente querer preencher com alguma coisa.

Amar não é fácil, mesmo quando se é correspondido. Mas não amar é uma tarefa que exige uma tranqüilidade que eu ainda não alcancei. Você fica com o sinal de alerta ligado por 24 horas por dia, 7 dias da semana! Fica a eterna busca. O medo da solidão. Porque as ilusões fazem companhia. Ilusões te colocam num mundo de fantasia que ajuda a lidar com a crueldade do mundo real. A falta de amor causa ansiedade. Faltam os desejos. Desejos bobos, simples. O desejo de apenas querer ver. Sentir o coração batendo mais forte. A alegria boba por ouvir um simples “oi” daquela pessoa. O frio na barriga ao sentir o cheiro dela. O desejo de conquistá-la.

É o amor que nos move. Amar te deixa pronto para assumir atitudes inimagináveis para se estar com alguém. Tira o sono, mas deixa um sorriso enigmático nos lábios por cada lembrança que arrepia a espinha.

Não amar te tira todas essas sensações indenomináveis, deixando apenas a falsa tranqüilidade que atormenta na busca por sentir-se novamente prisioneiro de um sentimento que, tamanha sua latência, faz te sentir vivo.

Liberdade é amar. E assim como Cazuza “eu quero a sorte de um amor tranqüilo”.

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